No domingo seguinte o encontro da tarde fora difícil. Lílian mostrou-se fria, como se apenas por obrigação estivesse recebendo o rapaz. Conversaram pouco, observaram muito a pesada chuva que caía.
À noite não choveu, mas o rapaz chegou, com má vontade, uns 15 minutos depois da hora costumeira. Deram-se, na varanda, uma beijoca, e ela, entrando com ele, foi ocupar-se na copa de um trabalho escolar.
— Estou terminando; senta aí! — intimou ela.
Mário ali ficou por um momento, mas como estava magoado voltou à sala de estar e ficou acompanhando o desenho animado na TV. No sofá refestelava-se Milton, o irmão caçula. Daí a pouco passaram por ali Dayse e Yasmim, vindas da cozinha.
Quando a garota terminou sua tarefa Nélio e Júlia já haviam expulsado Milton para um canto do sofá e ocupavam a sua maior parte. Lílian então chamou Mário para o pequeno sofá instalado na parte lateral da sala, junto ao tocafitas. Notando o seu acabrunhamento, perguntou:
— O que você tem?
— Estou chateado com você…
— Por que? — perguntou ela, quase indiferente. — Eu te fiz alguma coisa?
— Não é o que você fez, Li; é o que você não fez. Quando chego no escritório você me trata como a um estranho, e não como a um namorado. E agora à tarde teve novidade: você me tratou mal também aqui na sua casa…
— O que você quer que eu faça? Eu não posso abandonar o serviço para ficar conversando com você, Mário!
— Não é isso, Li. Não é o tempo que você perde comigo; é o modo como você me trata!
Ela nada respondeu.
Passou algum tempo e Mário concluiu que tanto o mutismo quanto a discussão levaria a nada. Fez então um esforço para tirar a mágoa do rosto e acariciou os cabelos de Lílian. Com isso ela também foi voltando à boa cara e acabaram se beijando.
Quando a mãe de Lílian e o garoto foram dormir, os dois namorados saíram para a penumbra da varanda. Ali ficaram a se beijar. Mário abriu um botão da blusa de Lílian, e assim alcançava seus seios por debaixo do tecido do sutiã. Estiveram praticando esses jogos amorosos por uns vinte minutos, até que o outro casal apareceu à porta. Mas Lílian já havia afastado a mão do rapaz e arrumado a blusa às pressas.
*
Era de novo sexta-feira, e ao findar o expediente Mário dera uma carona a Lílian. Estacionado o carro defronte à casa, a moça ficou séria.
— Mário, amanhã a gente não vai poder se ver.
— Não?! — reagiu ele, desapontado. — Por que?
— Porque não… — disse ela, displicente.
— Mas deve ter um motivo, Li. Por que a gente não poderá se ver?
— Não posso explicar…
E logo depois:
— Você ficou bravo?
— Não: apenas furioso!
E continuou:
— Pô, a gente fica a semana inteira sem namorar, e quando chega o sábado…
Lílian mostrava-se irredutível; Mário procurava uma fresta de esperança:
— Você vai sair? Não vai estar aqui nem à noite?
— Não; vou dormir cedo.
— Vai haver algum evento aqui na casa?
— Não.
— Por que, então?
— Não posso explicar…
— Lílian, você está propondo que terminemos?
— … Por que você está dizendo isso?
— É você que está dizendo isso.
E como ela não respondesse:
— Li, eu não gosto de agonia, sabe?
— Por que “agonia’?
— Se for para terminar no domingo, prefiro terminar agora.
Lílian retrucou, indiferente:
— Eu não estou querendo terminar com você!…
— Tá legal! — resolveu ele. — Amanhã a gente não se vê. E depois de amanhã?
— Depois de amanhã… — disse ela satisfeita, oferecendo os lábios para a despedida. — Depois de amanhã a gente se vê.
*
Domingo à noite. Mário chegou lá às 7 e meia, e quando estacionou o carro Lílian já abrira a porta da casa. Falaram-se “oi”, porém ela, embora não estivesse de mau humor, não se achegou a ele como de costume. Atravessaram a sala e foram para a copa, onde a garota estivera fazendo um trabalho escolar.
— Vamos terminar esse trabalho? — propôs ele. — Eu te ajudo!
Ela não se animou; ficou rabiscando o caderno, como se esperasse algo.
— Pensei que você não viesse… — disse ela num certo momento.
— Ué, por que eu deveria deixar de vir?
— … Depois preciso conversar com você.
A frase saiu rápida dos lábios da moça, em tom baixo. Nem bem a havia terminado e falou de outra coisa qualquer, em tom normal, como se quisesse encobrir aquelas palavras. Mário quase acreditou ter entendido mal.
Foram sentar-se no pequeno sofá lateral, pois no outro já estavam Júlio e Nélio. Mário percebeu que Lílian evitava aproximação, parecendo ainda esperar. Finalmente ela abriu um sorriso.
— Sexta-feira eu fui consultar a cigana!
— Verdade?
— Ahan! Ela falou certinho de tudo o que me aconteceu, e até da minha vida atual! Disse que eu estou namorando alguém muito bacana!…
— Disto eu estou sabendo! — brincou ele.
— Ela também falou no futuro. Falou que eu devia confiar em você…
— Que bom!…
— Disse que eu devia te amar muito!…
— Só não quero que você me ame só porque a cigana disse!…
Ela suspirou.
— Não sei, Mário… se eu vou ser capaz de te amar. Eu amei muito um outro moço…
Mário ficou sem o sorriso e completou por ela:
— … e ainda o ama.
Ela assentiu.
— Você sabe aonde eu fui ontem? — recomeçou Lílian, quase a medo.
— Acho que sei.
— Onde?
— Bom, não sei se vou acertar: num casamento.
— Quem te contou?
— Ninguém. Dedução minha. Há duas semanas ouvi a Júlia falar de um casamento; seria no dia 30…
— E você sabe onde aconteceu esse casamento?
— Não, não sei. Sei que foi numa fazenda.
— Sabe, Mário? Lá eu encontrei o Sérgio. Ele tinha avisado que iria ao casamento para falar comigo…
— E daí?…
Ela abaixou a cabeça, sem responder.
— E daí vocês resolveram voltar…
— Não é isso!… — retrucou Lílian.
— É esse o moço que você amou muito?
Ela fez que sim, sem levantar a cabeça.
— Você quer terminar?
Lílian assentiu, com um movimento quase imperceptível.
— Tá legal! — disse ele por fim, desconsolado. — A gente não pode ganhar sempre, não é? Em todo o caso… eu gostei muito de ter namorado com você. Tá legal: não estamos namorando mais.
Passado um momento, ela levantou a cabeça:
— Não foi isto o que eu quis dizer, Mário!
— O que foi, então, exatamente, o que você quis dizer?
Ela aproximou o seu rosto.
— Eu quero continuar com você, Mário!
E ofereceu os lábios.
— Então eu também quero! — disse ele, aliviado.
Beijaram-se.
— … Mesmo sabendo que eu amo outro?
Mário ficou aturdido. Preferia sair dali e pensar, mas era preciso responder, mesmo sentindo-se no papel de palhaço.
— Você tem ainda algum tipo de relacionamento com esse rapaz?
— Não.
— Não mesmo? — enfatizou ele, fitando seus olhos.
— Claro que não! — disse ela, entre séria e divertida.
Beijaram-se novamente.
— O que vocês conversaram no casamento?
— Ele queria voltar…
— E você concordou…
— Não; eu disse pra ele que estava tudo terminado.
— Mas se você o ama, por que não volta?
— Não posso…
— Por que não pode?
— Minha família não deixa…
— E isto é obstáculo?!…
— Claro que é.
— Há outro motivo além desse, não há?
— Talvez…
— Isto não é resposta, Li. Há ou não há?
Sentindo-se acossada, ela não respondeu. Mas depois asseverou, para encerrar o assunto:
— Eu preciso de você, Mário!
O rapaz refletia.
— E pra que é que você precisa de mim? Pra ajudar a esquecer?…
— Talvez…
Mas continuou, carinhosa:
— Sabe, Mário? Eu não posso ficar sozinha… Preciso de alguém pra conversar, contar meus problemas…
— Pois então acabou de encontrar! — brincou ele, já de melhor ânimo. — A partir de agora vamos ser amigos!
— … e namorados! — completou Lílian.
Depois disto Mário voltou a perguntar do ex-namorado, se não havia mais nada entre eles. Achou que devia ser informado caso o outro rapaz lhe propusesse nova entrevista.
Tudo então voltou ao normal, e pela primeira vez ela se interessou pela vida de Mário.
— Você gosta do seu serviço? — quis ela saber.
— Bom, eu gosto muito do que faço, pois é trabalho que me exige tanto no físico quanto no intelectual. Uma de minhas funções é visitar florestas e verificar seu estoque potencial de madeiras de lei. Percorro matas, às vezes escalo árvores gigantes para ter uma visão de conjunto. Outra função é cuidar dos contratos com os proprietários das terras, e depois regularizá-los nos cartórios e no teu escritório.
— E aquele seu colega de firma que estava tentando namorar a Neusa?
— Ah, o Jorge! Como colega de quarto, na República, é um cara legal, embora um tanto aloprado. É mais uma figura decorativa, cria de um político regional; um protegido do patrão…
— E as tuas namoradas? Quantas namoradas você já teve?
— Deixa eu pensar… Acho que três ou quatro, entre namoro e namorico… Pouco, né?
Então eles se beijaram longamente. Lílian posicionou-se no sofá de modo que os outros não percebessem a mão de Mário bolinando-a do lado esquerdo. Nisto a luz começou a enfraquecer, sinal de que apagaria em momentos. Aproveitaram então para intensificar os jogos amorosos. As mãos de Mário comprimiam ritmicamente os seios da moça. A mão esquerda desceu até a região do umbigo e dali sua palma percorreu e pressionou por dois segundos, por sobre a roupa, a região norte do triângulo púbico. Depois voltou ao seio. Já não se beijavam, pois ela se abandonava às carícias do rapaz. A luz apagou de vez. A mão desceu novamente e percorreu, pela primeira vez, sobre o tecido das calças jeans, as coxas e a região da vagina.
No sofá maior os outros dois tinham praticado exercícios semelhantes. Havia agora, sobre o televisor, uma vela trazida da cozinha. Lílian olhou interrogativamente para o rapaz, como querendo sondar suas intenções. Disse então, muito séria, que estava com sono e iria dormir.
Foram até a varanda para a despedida, mas ela não permitiu novas intimidades. Num abraço quase fraternal, ela encostou a cabeça no ombro de Mário e este acariciou ternamente os seus cabelos. Beijaram-se. O olhar de Lílian novamente o interrogou, mudamente.